segunda-feira, 25 de julho de 2011

Casamento de interesses

 
Por Folha de S. Paulo (Editorial)
 
Vem do mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), José Antonio Dias Toffoli, uma ilustração constrangedora da promiscuidade entre interesses públicos e privados que dá o tom da vida republicana no Brasil.

Em junho passado, realizou-se na romântica ilha italiana de Capri um casamento “de proporções épicas”, segundo a empresa que promoveu o evento. Duzentos convidados hospedaram-se num hotel de luxo; três deles confirmaram que despesas de hospedagem ficaram a cargo dos anfitriões.
O noivo era o advogado brasileiro Roberto Podval. Entre os convidados estava o ministro Toffoli. Sua viagem não despertaria muita crítica, não fosse por algumas circunstâncias comprometedoras.
Primeiro, Toffoli faltou a um julgamento no STF para participar das bodas. Vá lá; não é todo dia que uma festa desse quilate está ao alcance de juristas brasileiros.
Em segundo lugar, o noivo atua em dois processos dos quais o relator é Toffoli. Vá lá, comentaria com meridional bonomia algum velho tribuno dos tempos de declínio do Império Romano. Quem sabe o ministro terá pago as despesas de sua estadia; quem sabe poderá declarar-se sob suspeição nos julgamentos.

                O ministro da Advocacia Geral da União (AGU), José
                    Antônio Toffoli, em entrevista na semana passada
                    (Foto: Renato Araújo/Agência Brasil)

Segue-se o terceiro ponto: Toffoli recusa-se a dizer quem pagou pela viagem. Conforme nota de sua assessoria, o magistrado se reserva o direito de não fazer qualquer comentário sobre seus compromissos privados.
Ora, é exatamente dos compromissos pessoais -do peso que possam ter sobre seus julgamentos na condição de autoridade investida- que se trata. É o ministro quem parece ter misturado, a um ponto inadmissível, a ordem do privado e a esfera do público, nesse acontecimento.
Invocando a privacidade, Toffoli não dissipa nem a mais tênue suspeita de favor pessoal sobre seu comportamento. Com que autoridade julgaria, depois do precedente, qualquer caso que possa envolver tráfico de influência?
A presença de um ministro do Supremo no matrimônio pôs sob um mesmo teto o que não deveria estar unido nem na mais remota hipótese. Não se fez o enor esforço de distinguir entre o público e o privado. Mas, ao que tudo indica, Toffoli dá mais valor a festas de casamento do que a essa separação.

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