terça-feira, 23 de julho de 2013

CADEIA: PARA QUÊ?

Malu Fontes*

Os índices de violência no Brasil já são por si só assustadores para a população, seja ela de qualquer estado. Para os estrangeiros, são da ordem do inacreditável. O fenômeno ganha contornos ainda mais impossíveis de serem aceitos pelo povo quando se sabe que, em média, dos cerca de 50 mil homicídios praticados por ano no Brasil, somente 4 mil deles, uma média de 8% do total, segundo o Ministério da Justiça, são totalmente elucidados, sobrando algo da ordem de 100 mil assassinatos sem solução (e isso só até 2007). Como se o índice de resolução de crimes já não fosse escandalosamente pequeno, sobra ainda o assombro de ouvir diretamente da voz de autoridades da área de Segurança Pública declarações que parecem emitidas de terras sem lei e sem ordem. 
 
Há poucos dias, após a polícia anunciar a prisão de pistoleiros que, ao meio-dia, com a Praça da Piedade lotada, uma das principais de Salvador, assassinaram dois homens em decorrência de uma suposta disputa por território para a venda de drogas, o secretário da Segurança Pública da Bahia, Maurício Barbosa, declarou em entrevista coletiva, todo garboso, que 80% dos crimes cometidos na Bahia têm origem em ordens partidas de dentro do sistema carcerário de Salvador. Foi além: disse ainda que, diante desse dado, a responsabilidade é dos deputados, a quem caberia elaborar leis para proibir que as operadoras de telefonia celular possam operar na cadeia.
 
Não se sabe se, ao dar tais declarações, o secretário aposta na ignorância, na burrice, na ingenuidade ou num pacto de cinismo com o cidadão que o escuta e lê e vive aterrorizado com todos esses crimes “ordenados” de dentro da cadeia. A quem sobrou sensatez, perguntar não ofende: para que, então, manter cadeias, gastar milhões com o sistema carcerário se são justamente os criminosos já presos e sob a custódia e responsabilidade do Estado que tocam o terror nas ruas? Se continuam a delinquir, matar, roubar, sequestrar e traficar, por que, então, segundo a lógica do secretário, mantê-los presos? Se da cadeia conseguem fazer tudo isso, livres pelo menos restaria o argumento de que o Estado estaria eliminando custos com as cadeias. 
 
Quanto a responsabilizar os deputados pela falta de leis proibindo operadoras de celular de funcionar dentro de cadeias, parece, de novo, que o raciocínio é mais tortuoso do que o de bicho geográfico sob a pele humana. Como assim? Não cabe é à polícia e à Justiça de cada estado ficarem atentas para coibir e punir a corrupção carcerária entre policiais, agentes e presos, já que é através dela que se faz chegar às celas os celulares a partir dos quais são dados os comandos dos crimes? Desde quando há crime sendo ordenado de dentro da cadeia por falta de leis, secretário? Se falta há é a de fiscalização e de controle sobre a corrupção e sobre as propinas que rolam soltas entre os traficantes de grife presos e muitos agentes que estão mais a serviço do crime do que do Estado. 
 
Não são os deputados nem tampouco as operadoras que colocam celulares nas celas nem nas mãos de criminosos e disso sabe até um anencéfalo, se sobrevivesse. Desta vez, de Marcelo Nilo a seus pares a Marco Feliciano e sua trupe, bem como as operadoras de celular (embora bem mais sujas que pau de galinheiro com sua clientela), todos entraram de gaiatos na viagem argumentativa do secretário Maurício Barbosa. Se deputados e operadoras fossem solução para 80% dos homicídios na Bahia ou no Brasil, caberia muito pouco à SSP fazer. Menos, secretário, menos...

* Malu Fontes é jornalista e professora de jornalismo da Ufba

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