quinta-feira, 22 de agosto de 2013

O ATIVISMO DA VEZ É BI

Malu Fontes
A semana começou com meia dúzia de mano do curíntian em pé de guerra, praticamente pintada para a guerra, na porta de centros de treinamento e nas redes sociais, disposta a tudo para linchar um dos jogadores do timão, Emerson Sheik, por ele ter postado uma foto dando um selinho num amigo. Segundo o próprio Sheik, xingado com todas as ofensas do vocabulário homofóbico pela torcida corintiana, a atitude dupla, ou seja, o beijo no amigo e a publicização da cena através de uma fotografia postada numa rede social, teve como intuito, palavras dele, justamente protestar contra o preconceito e a homofobia. “Tem que ser muito valente para celebrar a amizade sem medo do que os preconceituosos vão dizer”, foram as palavras de Sheik. 
 
No mesmo final de semana do beijo anunciado como ativista por Sheik, Preta Gil anunciou que não se sente mais só, desde que Daniela Mercury anunciou o casamento com outra mulher, ao mesmo tempo em que desabafou o quanto sofreu preconceito por sempre ter assumido sua bissexualidade. Não se está falando aqui do fenômeno de sair do armário, mas de personalidades do mundo do entretenimento que, em um volume cada vez maior, vêm se tornando notícias, ou ainda mais noticiadas, por defender a causa da bissexualidade para si mesmas, embora em seguida digam não estarem falando em defesa própria, mas em defesa da sexualidade alheia. 
 
O exemplo mais emblemático talvez tenha sido o do ator da Globo José de Abreu, o Nilo, o sujismundo da novela Avenida Brasil, que, em janeiro deste ano, publicou no twitter, sem que ninguém o perguntasse, que, sim, era bissexual e que ninguém tinha nada a ver com isso. E não teria que ter mesmo. O surreal, no entanto, é que, meses depois, o próprio ator declarou numa longa entrevista que, de saco cheio com o preconceito que vê sendo dirigido aos homossexuais, resolveu assumir falsamente uma bissexualidade que na verdade nunca foi sua. 
 
Os homossexuais agradecem o apoio, mas é bom não perder de vista que, nesse modismo em cujo contexto todos e qualquer um se acham no direito de publicizar falas e performances como se fossem bandeiras de apoio à causa homossexual, as fronteiras entre ativismo e oportunismo podem ir se tornando cada vez mais fluidas ou, pior, podem resvalar para um tiro no pé. O fato de todo mundo dizer-se bi já se tornou até piada: “Todo mundo hoje é bi: bissexual, bipolar ou biscate”, diz-se. Até que ponto o beijo orgulhosamente anunciado como bandeira proposital por Sheik contribui para o respeito aos homossexuais, vá saber... Considerando-se as reações dos torcedores, os gays ganharam foi um cavalo de troia, cheio de ofensas dentro.
 
O outro aspecto dessa moeda é a necessidade que todos que frequentam o mundo da fama têm hoje de ter, dia sim e outro também, um factoide sobre si para continuar surfando nas páginas noticiosas de entretenimento. Se anunciar-se bi como estratégia tá valendo, então, o Sheik que ontem preenchia as páginas por contrabandear carro, criar macaca em cativeiro e falsificar documentos, agora preenche-as porque é o mais novo ativista bi dos últimos dias. Ah, e antes que os comentários neste jornal e as postagens em redes sociais adjetivem a autora deste texto como a pongueira (sic) e oportunista que passou a escrever em jornal depois do casamento com Daniela, não custa ressaltar de novo-outra vez: quem vos escreve não é a Malu esposa de Daniela. Eu sou a outra.

Malu Fontes é jornalista e professora de Jornalismo da Ufba

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