para transformar a educação no país


Inconformados com o adiamento da Conferência Nacional de Educação, com a demora da tramitação do Plano Nacional de Educação e pelo descaso histórico com a educação pública, um grupo de educadores da Bahia quer ampliar a voz da categoria e fazê-la chegar aos atuais e futuros representantes políticos.
Com um convite para que educadores de todo o país reflitam sobre três perguntas –O que queremos para a educação brasileira? Qual a nossa responsabilidade? O que queremos dizer ao Brasil?–, eles começam a espalhar o movimento “Educação em nossas mãos”.
Os depoimentos postados na página ou enviados para o e-mail cpneducacao@gmail.com do movimento vão se transformar no documento colaborativo “Vozes dos educadores brasileiros”, a ser entregue no dia 19 de maio, em Brasília, aos representantes políticos e aos pré-candidatos à Presidência da República.
Antes disso, eles organizarão, no gramado em frente ao Congresso Nacional, no dia 17 de maio, das 10h às 18h, a Conferência Popular Nacional de Educação. “Os educadores brasileiros podem e devem assumir a responsabilidade pelo debate em torno dos desafios a serem enfrentados”, afirma uma das líderes do movimento, a educadora Cybele Amado de Oliveira, do ICEP (Instituto Chapada de Educação e Pesquisa).
“Uma das nossas maiores responsabilidades como educadores é sermos mais: na sala de aula, nas práticas pedagógicas, nas discussões produtivas dos planejamentos coletivos com os colegas, no que sentimos, no que sonhamos  transformar, no reconhecimento dos nossos saberes e nas angústias dos nossos não saberes.”
A seguir, sua entrevista exclusiva ao QI.
ICEP
QI – Qual o cenário da educação brasileira?
Cybele - Nas últimas décadas, conseguimos avanços significativos na educação pública brasileira. Entretanto, ainda há muitos desafios a serem enfrentados e superados. É preciso desnaturalizar o fracasso escolar e garantir o direito a todos os estudantes de desenvolver na escola as competências necessárias para participar da vida pública com dignidade. Isso implica mudanças estruturais que passam pela legislação que regulamenta o funcionamento e o aporte de recursos na educação brasileira, a reforma curricular, as condições mínimas de infraestrutura das escolas e, principalmente, a melhoria das condições de trabalho dos professores, o que inclui formação continuada e remuneração justa.
QI – Qual a responsabilidade dos educadores neste cenário?
Cybele - Os educadores brasileiros podem e devem assumir a responsabilidade pelo debate em torno dos desafios a serem enfrentados. Desta forma, será potencializada a compreensão em torno da educação como um bem público e certamente teremos um envolvimento maior de todos os setores da sociedade brasileira.
Nós, educadores, também precisamos unir forças coletivas na comunidade para alcançarmos os resultados que almejamos. É preciso nos colocarmos como sujeitos ativos nos processos. E creio que uma das nossas maiores responsabilidades como educadores, como diria o nosso querido Paulo Freire, é sermos mais: na sala de aula, nas práticas pedagógicas, nas discussões produtivas dos planejamentos coletivos com os colegas, no que sentimos, no que sonhamos  transformar, no reconhecimento dos nossos saberes e nas angústias dos nossos não saberes. É nossa responsabilidade seguir colaborando profundamente conosco mesmo e com o outro no compromisso com a mudança. 
QI – Quais as implicações do adiamento da Conferência Nacional de Educação?
Cybele - Segundo informações publicadas na imprensa, os motivos foram relacionados a gastos e demandas de licitações. O maior problema do adiamento de um debate tão importante é efetivamente deixar para depois algo que já deveria ter sido discutido.
É agora e neste instante que milhares de estudantes e educadores vivem todos os dias situações extremamente difíceis. Desde condições de infraestrutura até avanços significativos nos resultados.
E, considerando que estamos em ano eleitoral, a realização da conferência [evento com a participação de integrantes da sociedade civil e do governo, que tem, entre os objetivos, discutir metas para o setor] antes das eleições contribuiria muito com a consideração das questões educacionais na elaboração das pautas políticas.
QI – Por que a demora da tramitação do Plano Nacional de Educação?
Cybele - À distância acompanhamos as discussões e mudanças no texto e, ao que parece, uma das maiores discussões no momento está relacionada a questões de gênero e religião, que são extremamente importantes. No entanto, já estamos a 1.198 dias sem aprovação do plano nacional. Vale considerar que o PNE é para dez anos e precisamos ter as metas, além de aprovadas, em efetivo processo de ação.
QI – Os educadores falam em descaso histórico com a educação pública do nosso país. Poderia contextualizar?
Cybele - Em 1992, as escolas públicas da Chapada Diamantina (BA) não tinham carteiras, livros, quadros, papéis e materiais. [Havia] um percentual altíssimo de evasão escolar, chegando a quase 30%. Nossos professores, além de terem baixos salários, não tinham condições mínimas de trabalho, como água e luz nas escolas.
E ainda temos situações no nosso país semelhantes a essas. Escolas feitas com tábuas de madeira nas beiras dos rios que, quando enchem, impedem as aulas. Avançamos, mas ainda temos muito para caminhar. Lembro-me de que, quando cheguei pela primeira vez numa escola pública, o quadro-negro tinha um buraco no meio, a sala de aula era de chão batido e, sempre que chovia, não sabíamos como continuar as aulas. E eu pensava: ”O que é mesmo que nosso país entende como profissão de professor?”.
Outro exemplo de descaso que segue na atualidade diz respeito à descontinuidade política nos âmbitos nacional, estadual e municipal. Neste país, tivemos vários bons programas que acabaram tão logo o governo vigente mudou. Isso sem contar com o sumiço de dados dos estudantes, documentos e muitas vezes, nos anos das eleições municipais, suspensão de aulas, transporte escolar e merenda, bem como demissão de educadores e funcionários. 
QI – O que esse movimento quer dizer ao Brasil?
Cybele - O movimento Educação em Nossas Mãos quer dizer que somos educadores, que ser professor é uma profissão, que acreditamos na educação, que temos esperança, que precisamos de todos para mudar a educação do Brasil, que nossas vozes fiquem registradas e ressoem de forma propositiva nas decisões tomadas por nossos representantes.
Que também nós, educadores, somos responsáveis, que é preciso um coletivo colaborativo nas escolas e que as condições estruturais precisam ser resolvidas de imediato.  
QI – Como as pessoas podem criar o movimento Educação em Nossas Mãos na cidade delas?
Cybele - Na Chapada Diamantina, um mutirão de educadores animados irá em marcha para Brasília. Vamos iniciar estendendo a bandeira “Educação em nossas mãos” no Morro do Pai Inácio.
Cada cidade pode levar uma caravana para Brasília, com suas ideias para ajudar a compor o documento “Vozes dos Educadores Brasileiros”.
QI – Qual a expectativa do movimento?
Cybele - Esperamos grande adesão para elaborar um documento com as ideias dos educadores que forem ao gramado do Congresso Nacional, no dia 17 de maio, e com as muitas frases e propostas de mudança que já estão sendo postadas no Facebook da campanha.
Vamos solicitar um espaço no Congresso, no dia 19 de maio, para distribuirmos esse documento. E convidaremos os pré-candidatos para também receberem o ”Vozes dos Educadores Brasileiros”.
E que nós, educadores, possamos seguir sonhando e reencontrando nossa força.
Por QSocial